Conteúdo143CloContentview.full.text
Títulotexto

Texto

Relato sobre tônus e sua relação com a motricidade na Eutonia

Descriçãotexto

A autora reflete sobre o tônus como a tensão justa ou equilibrada relacionada aos gestos e ao movimento, à psique e à atividade mental.

Imagemimage
Informações Extrastexto
Fernanda Gomes Fonseca Bevilaqua
Titulo
Categoria
Categoriastexto
Titulo
Tags
Tagstexto
tônus, motricidade, gesto
Titulo
Publicado no site em
Datadata
31/12/1969
Titulo
Autoria
Autortexto
Fernanda Gomes Fonseca Bevilaqua

Reflito sobre o tônus na eutonia como a tensão justa ou equilibrada e, ao mesmo tempo essa tensão relacionada diretamente com os gestos e o movimento, a psique e a atividade mental, ou seja um equilíbrio da globalidade corporal a partir do equilíbrio das tensões. Já, a motricidade entendo como a organização complexa da construção coordenada dos gestos humanos traduzindo nossa expressão corporal e psíquica antecedendo o ato motor. 

Evidentemente são duas definições simplificadas, mas que busco entender sob a luz da minha vivência com a eutonia. Pensando nessas duas definições, é possível então relacionar o tônus e a motricidade numa interdependência estreita. Uma entrelaçando sua função com a outra. Para que ocorra um bom equilíbrio e harmonia na organização dos gestos e movimentos corporais e que expressem em nossas relações com o outro e com o ambiente um equilíbrio também de nossas emoções, é necessário que haja também um esforço das potências musculares também justo e equilibrado. Caso contrário, se uma grande tensão muscular desnecessária por exemplo é acionada em uma determinada parte de nosso corpo ou algumas, para a ação de um gesto cotidiano, nossa motricidade pode ser comprometida. O contrário também pode acontecer: Se o esforço que precisamos para realizar algum gesto ou movimento não é suficiente, resultando num tônus muito baixo e insuficiente para a ação muscular, o comprometimento da motricidade também fica evidenciado. Como repetimos os gestos e movimentos básicos ou complexos do nascimento ao fim
da vida quando estamos saudáveis, esse equilíbrio maior ou menor, ou desequilíbrio tônico que se inicia na vida uterina, pode, se não for percebido pela própria pessoa ou por um cuidador da criança, tornarem-se um entrave na expressão de nossos sentimentos e desejos no ambiente e em nossas relações. Expressão que pode ser traduzida e percebida na construção de nossos gestos. É como se, a cada vez que repetíssemos um gesto mal coordenado, decorrente de um uso desequilibrado do tônus, ficasse registrado em nossa memória corporal, um jeito de ser no mundo e isso vai tomando proporções diferentes a medida que nos conectamos com nosso corpo de fato, ou não. É evidente que precisa se relativizar casos e casos, que isso não é determinante para todos, mas uma é uma constatação importante para se refletir sobre a relação tônus/ motricidade. 

Proponho-me, para pensar nessa relação, o compartilhamento de uma vivência pessoal em que pude perceber uma dificuldade em realizar um movimento aparentemente simples, por sentir a força que colocava , exatamente em toda a região que mais necessitava para aquele movimento. Senti e percebi objetivamente que aquela tensão me impossibilitava realizar aquele gesto com equilíbrio.

Numa aula de eutonia, na verdade uma aula de fenomenologia em que fui escrever sobre o que o professor estava falando, percebi que colocava uma força além do necessário, fato que não havia notado até então, apesar de ouvir de algumas pessoas que minha letra é tremida e que pego a caneta com muita força. Na verdade eu mesma não sentia isso. Apenas concordava que minha letra era tremida e um tanto ilegível. De fato sentia dificuldade para me coordenar na escrita. Nem mesmo eu entendia o que escrevia. Nesse dia em especial durante a aula na formação em eutonia, percebi claramente a força enorme que faço para segurar a caneta, essa força de tensão muscular iniciava-se nos dedos da mão direita e terminava em todo o lado direito do pescoço, inclusive passando pelas escápulas e clavículas. Como pude perceber essa força, comecei a escrever com a atenção especial em meus ossos de toda a cintura escapular. Senti muito incômodo, pois era como se com a atenção voltada para esses ossos eu fosse incapaz de segurar a caneta, quão tensos estavam todos esses segmentos musculares dessa região. Passei então a empurrar os ísquios contra o chão ou contra a cadeira. Quando faço isso, tiro o foco de atenção dos músculos e sinto que minha escrita, apesar de não resultar numa letra boa, me deixa menos tensa e menos irritada ao escrever. Percebo então, que o tônus muito alto que coloco na mão em especial para escrever, me impede de ter uma boa coordenação e ainda, conseguir uma escrita fluida sem cortes nas letras. Isso não diz respeito aos músculos não responderem ao desejo de escrever, mas à quantidade de tensão que coloco para realizar a escrita. Sempre ouvi isso de meus professores, fiz caligrafia durante muitos anos e ainda hoje sinto dificuldade para escrever fluidamente. Preciso cortar as letras para continuar a escrita. Essa tensão adquirida ainda na infância, nos primeiros momentos da aquisição da escrita, não foi equilibrada em mim durante toda vida de estudante. Hoje posso perceber isso. As correções que ouvia a partir dessa constatação eram apenas no âmbito da observação sobre minha letra ilegível e a necessidade de eu fazer a caligrafia. Quanto mais eu escrevia nos cadernos, mais me sentia cansada. Durante essa aula de eutonia, no ano passado, pude perceber o quanto essa força estava ligada, além da força extrema, me causando tensões mais altas na cintura escapular, a falas das pessoas mais ligadas a mim na infância , como professores e minha mãe que me incentivavam a superar e vencer com energia os problemas que enfrentava na escola, como esse por exemplo. Nesse dia me lembrei de uma fala de minha mãe, num desses momentos de fazer a caligrafia. Eu sentia muito cansaço e não conseguia repetir a infinidade de palavras que deveria copiar. Minha mãe se sentava junto comigo e dizia: Ponha força nesse lápis, vamos… Atualmente procuro perceber essas tensões e minha relação de força excessiva para executar os movimentos diários.Não só na escrita. Posso concluir, avaliando em meu próprio corpo a relação íntima e profunda do tônus e motricidade. Superar, nesse caso a letra ruim, teve sempre para mim uma relação intrínseca com força muscular. Tenho tentado me observar escrevendo, através da atenção nos ossos e da técnica do repousser em Eutonia. A coordenação de minha escrita não chegou a mudar, mas a percepção da força consegue me apontar caminhos.

O professor Vítor da Fonseca afirma que "o tônus garante como consequência, as atitudes, as posturas e a mímica. A sua regulação complexa, que abordamos, é dependente das emoções e do controle afetivo e constitui um dos meios de preparação da representação mental". Essa afirmação me coloca de frente a um entendimento do tônus que ultrapassa apenas o que diz respeito a um funcionamento do músculo no corpo e suas respostas ao sistema neuronal, mas o quanto a utilização do mesmo, numa atenção especial para os ossos, articulações e pele e no movimento, nas posturas e nos gestos, pode ajudar a construir melhor a nossa motricidade. Isso também se aplica ao nosso nascimento e aprendizado dos gestos num ambiente afetivo.

A eutonia, neste caso, favorece entrar em contato com minhas tensões e permitir na observação das mesmas, um contato com minhas emoções, orientando-me a ( re ) conhecer o que está em desequilíbrio, o que está comprometendo a harmonia de meus movimentos/emoções/pensamentos. A observação e a percepção que têm acontecido comigo neste caso específico, não estão necessariamente aliadas à correção imediata, mas,para mim já é um passo importante para outro jeito de aprender e reaprender o movimento enquanto expressão de um bom equilíbrio psicomotor.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
FONSECA, Victor. Psicomotricidade – Filogênese, ontogênese e retrogênese. Rio de Janeiro:
Walkmans,2009.
GAINZA, Violeta Hamsy. Conversas com Gerda Alexander: vida e pensamento da criadora da
eutonia. São Paulo: Summus,1997.
SITE PESQUISADO:
Motricidade e corporeidade humana na experiência filosófica.
Disponível em: http://www.efdeportes.com/efd155/motricidade-humana-na-experienciafilosofica.htm
Acesso em 14 nov. 2013