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Eutonia e Percepção

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A autora explora os aspectos neurofisiológicos da percepção e sua relação com a eutonia.

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Maria Renata de Almeida Viana
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córtex cerebral, percepção, sistema sensorial somático
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Publicado no site em
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31/12/1969
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Maria Renata de Almeida Viana

Gerda Alexander escreveu um único livro e o chamou “Eutonia, Um Caminho Para a Percepção Corporal”.

Nesses meus anos como aluna e professora de Eutonia estive curiosa e atenta às questões como a percepção, o conhecimento do corpo, a imagem corporal. Tenho estudado estes temas e a medida que aumenta a minha compreensão, mais sei da importância deste trabalho ao qual me dedico, a Eutonia.

O texto que segue, escrito de maneira simplificada, pretende mostrar o caminho desde o estímulo nos receptores do Sistema Sensorial Somático até a sua interpretação no córtex cerebral, isto é, o substrato neurofisiológico da percepção, parte do trabalho proposto por Gerda Alexander.

É importante dizer que este é um recorte dentro do estudo da percepção do ponto de vista neurológico. Aqui está posto somente o que interessa para a compreensão da Eutonia.

O conhecimento que temos do mundo se dá através do sistema sensorial. A percepção se inicia nos receptores, cada um deles sensível a um tipo de estímulo. A partir do receptor, vias sensoriais se dirigem à medula espinal, tronco cerebral, tálamo e córtex cerebral. No córtex as informações sensoriais são interpretadas e reinterpretadas. Deste modo o cérebro constrói uma representação interna dos eventos físicos externos e, importante, essas percepções não são cópias precisas e diretas do mundo à nossa volta, visto que, a todo momento as informações sensoriais são editadas.

São cinco modalidades sensoriais principais : a visão, a audição, a gustação, a olfação e o tato (tato é o modo simplificado de chamar as sensações corporais ou somáticas). Diferentes formas de energia, luminosa, mecânica, térmica, química estimulam receptores específicos e são transformadas pelo sistema nervoso nas diferentes modalidades sensoriais. Recebemos ondas eletromagnéticas de diferentes freqüências e percebemos cores, recebemos ondas de pressão e ouvimos palavras, música.

Para cada uma das modalidades sensoriais, há um sistema sensorial: visual, auditivo, gustativo, olfativo e o sistema sensorial somático.

Para a abordagem proposta, o Sistema Sensorial Somático é o mais importante e tem quatro submodalidades:

Tato propriamente dito, que é o sentido da textura dos objetos e do seu movimento sobre a pele. É provocado pela estimulação mecânica da pele onde se encontram os receptores.
Propriocepção, o sentido da posição dos membros e tronco no espaço oferecidos pela percepção da angulação das articulações. Os receptores estão nas articulações e nos músculos.
Nocicepção: sinaliza lesão tecidual geralmente percebidas como dor. É provocada por estímulos nocivos químicos, mecânicos ou térmicos.
Temperatura, que sinaliza calor e frio. Provocada por estímulos frios ou quentes.

No Sistema Sensorial Somático, o contato inicial com o mundo externo ocorre então através de células especializadas, os receptores sensoriais , mecanoreceptores, termoreceptores, nociceptores e quimioreceptores, localizados na pele e outros tecidos do corpo como músculos e articulações. No receptor, a energia do estímulo é transformada em um sinal neural eletroquímico. A partir do receptor, três neurônios ligam a pele e outros tecidos ao córtex cerebral. O primeiro neurônio conduz a informação sensorial do receptor até o tronco cerebral, o segundo cruza a linha média e vai até o tálamo contralateral e o terceiro daí ao córtex cerebral, região do lobo parietal anterior chamada córtex sensorial somático primário ou S 1. Cada via individual é organizada em série, e as várias vias de um sistema são organizadas em paralelo. As quatro submodalidades da sensação somática (tato, propriocepçao, nocicepção e temperatura) são conduzidas por duas vias paralelas. Então, no córtex as informações são combinadas para as percepções. Por exemplo, tato e propriocepção se combinam para que possamos reconhecer a forma e tamanho dos objetos apreendidos (textura + angulação das articulações).

No córtex parietal ou S1, para cada submodalidade do sistema sensorial primário há um mapa. São quatro mapas completos em cada uma das quatro áreas de Brodman que correspondem a S1 (3a, 3b,1 e 2). Mapa para o tato, para a propriocepção, nocicepção e temperatura. No caso do tato, o homúnculo de Penfield que é o mapa sensorial da superfície do corpo.

Todo o processamento desde o estímulo até a sua interpretação no córtex é bastante complexo. Está simplificado aqui porque este texto não se destina ao estudo da neurofisiologia, mas sim ao processo que fundamenta o trabalho de Gerda Alexander.

Baseado em estudos de casos de pacientes com lesão cerebral, ou a partir de estudos em animais ou ainda através de exames de neuroimagem que dão informações sobre a função do córtex, pode se afirmar que tal representação do espaço pessoal no córtex parietal difere sistematicamente entre indivíduos, de uma maneira que reflete o seu uso. A representação portanto é modificável pela experiência. Há uma determinação genética que programa os padrões das conexões entre neurônios, mas que é afetada pela atividade e aprendizado.

Além disso, o Sistema Sensorial Somático projeta para outras áreas, entre elas para o córtex parietal posterior (áreas 5 e 7 de Brodmann), onde as informações são usadas para configurar a imagem corporal e para planejamento de movimentos no espaço extrapessoal. O córtex posterior recebe entrada também do sistema sensorial auditivo e visual, colocando então a representação do corpo no espaço extrapessoal.

Cada vivência de Eutonia faz e refaz o trajeto desde o receptor, através dos neurônios até o córtex parietal. Está portanto orientado à percepção do corpo do modo como a descrevemos acima. Com seu trabalho sobre pele, ossos, articulações vai influenciar a representação do corpo no córtex e mais importante, a imagem corporal.

Parte do trabalho desenvolvido por Gerda se destina a isto, conhecimento do corpo, ampliação da sua percepção e interferência positiva no processo de reconstrução/desconstrução da imagem corporal. Esse é um dos pilares deste trabalho corporal, talvez não o mais importante, mas seguramente aquele que pode ser a base em todas as etapas.

A ampliação da percepção e sua influência sobre a imagem corporal se refletirão na vida daquele que pratica a Eutonia de muitas maneiras. Este texto não tem a intenção de discorrer sobre os benefícios desta prática (isto está posto nos livros e artigos que tratam deste trabalho corporal) e sim de mostrar a relação entre a vivência da Eutonia e Percepção.

 

Livros que julgo importantes para aquele que desja aprofundar-se;

•  Eutonia, um caminho para a percepção corporal, Gerda Alexander, 1976.

•  Eutonia, educação do corpo para o ser, Berta Vishnivetz 1995.

•  Neuroanatomia Funcional, Ângelo Machado, 1998.

•  Fundamentos da Neurociência, Eric R. Kandel, James H. Schwartz, Thomas M. Jessel, 1995.